Pesquisar este blog

HOMILIAS PAPA FRANCISCO


Homilia do papa em Santa Marta: Não sejamos cristãos morcegos


Há cristãos que têm medo da alegria da ressurreição que Jesus quer nos dar: a vida deles parece um funeral. Mas o Senhor ressuscitado está sempre conosco, ressaltou o papa Francisco em sua homilia durante a missa celebrada na manhã de hoje na capela da Casa Santa Marta.
A liturgia do dia narra a aparição de Cristo ressuscitado aos seus discípulos. Diante da saudação de paz de nosso Senhor, os discípulos, em vez de se alegrarem, ficaram “transtornados e cheios de temor”, pensando “que viam um fantasma”. Jesus tentou fazê-los entender que o que viam era real, os convidou a tocar nele e pediu que lhe dessem de comer. Ele quer conduzi-los à “alegria da ressurreição, à alegria da sua presença entre eles”. Mas os discípulos “não podiam crer, porque tinham medo da alegria”, disse o papa.
“Esta é uma doença dos cristãos. Temos medo da alegria. É melhor pensar: ‘Sim, sim, Deus existe, mas está lá longe; Jesus ressuscitado, Ele está lá’. Um pouco de distância. Temos medo da proximidade de Jesus, porque ela nos traz alegria. E isso explica a existência de tantos cristãos com cara de enterro, não é? Que a vida deles parece um funeral contínuo. Preferem a tristeza, não a alegria. Ficam mais à vontade não na luz da alegria, mas nas sombras, como aqueles bichos que só conseguem sair de noite, mas não à luz do dia, porque não enxergam nada. Como os morcegos. E, com um pouco de senso de humor, podemos dizer que existem cristãos morcegos, que preferem as sombras à luz da presença do Senhor”.
Mas “Jesus, com a sua ressurreição, nos dá a alegria: a alegria de ser cristãos; a alegria de segui-lo de perto; a alegria de andar pelo caminho das bem-aventuranças, a alegria de estar com Ele”.
“E nós, muitas vezes, ficamos transtornados com essa alegria, ou cheios de medo, ou achando que estamos vendo um fantasma, ou pensando que Jesus é um modo de ser: ‘Mas nós somos cristãos e temos que fazer assim. Mas onde é que está Jesus? ‘Não, Jesus está lá no Céu’. Você fala com Jesus? Você diz a Jesus: ‘Eu creio que Tu vives, que Tu ressuscitaste, que Tu estás perto de mim, que Tu não me abandonas’? A vida cristã tem que ser isso: um diálogo com Jesus, porque Jesus está sempre conosco. Isso é verdade! Ele está sempre conosco no meio dos nossos problemas, das nossas dificuldades, das nossas obras boas”.
Quantas vezes nós, cristãos, “não somos alegres porque temos medo!”. Cristãos que “foram vencidos” na cruz!
“Na minha terra há um ditado que diz assim: ‘Quem se queima com leite fervendo, quando vê uma vaca chora’. E esses cristãos se queimaram com o drama da cruz e disseram: ‘Não, vamos parar por aqui. Ele está no Céu. Muito bem, Ele ressuscitou, mas que não venha aqui de novo, porque não vamos poder mais’. Peçamos a nosso Senhor que Ele faça conosco o que fez com os discípulos que tinham medo da alegria: que Ele abra a nossa mente. ‘Então abriu-lhes a mente para compreenderem as Escrituras’. Que Ele abra a nossa mente e nos faça compreender que Ele é uma realidade viva, que Ele tem corpo, que Ele está conosco, que Ele nos acompanha e que Ele venceu. Peçamos ao Senhor a graça de não ter medo da alegria”.

Homilia do papa Francisco na Vigília Pascal

Leia, na íntegra, a homilia do papa Francisco durante a vigília pascal, celebrada neste sábado, 19, na  Basílica de São Pedro.

HOMILIA DO SANTO PADRE
MISSA da VIGÍLIA PASCAL

O Evangelho da ressurreição de Jesus Cristo começa referindo o caminho das mulheres para o sepulcro, ao alvorecer do dia depois do sábado. Querem honrar o corpo do Senhor e vão ao túmulo, mas encontram-no aberto e vazio. Um anjo majestoso diz-lhes: «Não tenhais medo!» (Mt 28, 5). E ordena-lhes que levem esta notícia aos discípulos: «Ele ressuscitou dos mortos e vai à vossa frente para a Galileia» (28, 7). As mulheres fogem de lá imediatamente, mas, ao longo da estrada, sai-lhes ao encontro o próprio Jesus que lhes diz: «Não temais. Ide anunciar aos meus irmãos que partam para a Galileia. Lá me verão» (28, 10).
Depois da morte do Mestre, os discípulos tinham-se dispersado; a sua fé quebrantara-se, tudo parecia ter acabado: desabadas as certezas, apagadas as esperanças. Mas agora, aquele anúncio das mulheres, embora incrível, chegava como um raio de luz na escuridão. A notícia espalha-se: Jesus ressuscitou, como predissera... E de igual modo a ordem de partir para a Galileia; duas vezes a ouviram as mulheres, primeiro do anjo, depois do próprio Jesus: «Partam para a Galileia. Lá Me verão».
A Galileia é o lugar da primeira chamada, onde tudo começara! Trata-se de voltar lá, voltar ao lugar da primeira chamada. Jesus passara pela margem do lago, enquanto os pescadores estavam a consertar as redes. Chamara-os e eles, deixando tudo, seguiram-No» (cf. Mt 4, 18-22).
Voltar à Galileia significa reler tudo a partir da cruz e da vitória. Reler tudo – a pregação, os milagres, a nova comunidade, os entusiasmos e as deserções, até a traição – reler tudo a partir do fim, que é um novo início, a partir deste supremo ato de amor.
Também para cada um de nós há uma «Galileia», no princípio do caminho com Jesus. «Partir para a Galileia» significa uma coisa estupenda, significa redescobrirmos o nosso Batismo como fonte viva, tirarmos energia nova da raiz da nossa fé e da nossa experiência cristã. Voltar para a Galileia significa antes de tudo retornar lá, àquele ponto incandescente onde a Graça de Deus me tocou no início do caminho. É desta fagulha que posso acender o fogo para o dia de hoje, para cada dia, e levar calor e luz aos meus irmãos e às minhas irmãs. A partir daquela fagulha, acende-se uma alegria humilde, uma alegria que não ofende o sofrimento e o desespero, uma alegria mansa e bondosa.
Na vida do cristão, depois do Batismo, há também uma «Galileia» mais existencial: a experiência do encontro pessoal com Jesus Cristo, que me chamou para O seguir e participar na sua missão. Neste sentido, voltar à Galileia significa guardar no coração a memória viva desta chamada, quando Jesus passou pela minha estrada, olhou-me com misericórdia, pediu-me para O seguir; recuperar a lembrança daquele momento em que os olhos d’Ele se cruzaram com os meus, quando me fez sentir que me amava.
Hoje, nesta noite, cada um de nós pode interrogar-se: Qual é a minha Galileia? Onde é a minha Galileia? Lembro-me dela? Ou esqueci-a? Andei por estradas e sendas que ma fizeram esquecer. Senhor, ajudai-me! Dizei-me qual é a minha Galileia. Como sabeis, eu quero voltar lá para Vos encontrar e deixar-me abraçar pela vossa misericórdia.
O Evangelho de Páscoa é claro: é preciso voltar lá, para ver Jesus ressuscitado e tornar-se testemunha da sua ressurreição. Não é voltar atrás, não é nostalgia. É voltar ao primeiro amor, para receber o fogo que Jesus acendeu no mundo, e levá-lo a todos até aos confins da terra.
«Galileia dos gentios» (Mt 4, 15; Is 8, 23): horizonte do Ressuscitado, horizonte da Igreja; desejo intenso de encontro... Ponhamo-nos a caminho!


Fonte:  Rádio Vaticano

O papa na missa crismal: a disponibilidade do sacerdote abre as portas da Igreja

Na homilia desta quinta-feira, Francisco fala da alegria do sacerdócio: ela unge, é incorruptível e é missionária

O Santo Padre chegou por volta das 9h30 desta manhã à Basílica de São Pedro para presidir a missa crismal, concelebrada por cardeais, bispos e padres diocesanos e religiosos presentes em Roma. O branco das albas sacerdotais resplandecia nas primeiras filas da basílica.
Durante a celebração, os sacerdotes renovaram as promessas feitas no momento da sagrada ordenação. Foram abençoados, em varias ânforas, o óleo dos enfermos, o óleo dos catecúmenos e o crisma.
A missa crismal é uma liturgia celebrada neste dia em todas as igrejas catedrais do mundo. Foi a segunda vez que Francisco a celebrou na Basílica Vaticana desde que foi eleito sucessor de Pedro.
Na homilia, o papa ressaltou a alegria de ser sacerdote. "A alegria do sacerdote é um bem precioso não só para ele, mas também para todo o povo fiel de Deus: esse povo fiel do meio do qual o sacerdote é chamado para ser ungido e para o qual é enviado para ungir".
Francisco recordou que "o sacerdote é o mais pobre dos homens se Jesus não o enriquece com a sua pobreza; o mais inútil dos servos se Jesus não o chama de amigo; o mais néscio dos homens se Jesus não o instrui pacientemente como fez com Pedro; o mais indefeso dos cristãos se o Bom Pastor não o fortalece em meio ao rebanho".
O Santo Padre indicou três traços significativos da alegria sacerdotal. A alegria que unge: "ela penetrou no íntimo do nosso coração, o configurou e o fortaleceu sacramentalmente"; a alegria incorruptível: "a integridade do Dom, ao qual ninguém pode subtrair nem agregar nada, é fonte incessante de alegria"; e a alegria missionária: "a unção é para ungir o santo povo fiel de Deus: para batizar e confirmar, para curar e consagrar, para abençoar, para consolar e evangelizar".
O papa disse ainda que, mesmo nos momentos de tristeza, "em que tudo parece escurecer e a vertigem do isolamento nos seduz, nesses momentos apáticos e cabisbaixos que às vezes nos assaltam na vida sacerdotal", e pelos quais “eu também passei”, disse Francisco, mesmo nesses momentos "o povo de Deus é capaz de conservar a alegria, é capaz de proteger você, de abraçar você, de ajudar você a abrir o coração e a reencontrar uma renovada alegria".
Por outro lado, o pontífice recordou que a alegria é guardada pelo rebanho e por três “irmãs” que a acompanham e defendem: a irmã pobreza, a irmã fidelidade e a irmã obediência.
"Muitos, ao falar de crise de identidade sacerdotal, não percebem que a identidade pressupõe a pertença. Não há identidade, nem alegria de ser, sem a pertença ativa e comprometida ao povo fiel de Deus". Do mesmo modo, destacou o papa, "se você não sair de si mesmo, o óleo se torna azedo e a unção não pode ser fecunda. Sair de si mesmo implica despojamento de si, implica pobreza".
Francisco falou então da irmã fidelidade: "Os filhos espirituais que nosso Senhor dá para cada sacerdote" são como a “Esposa” predileta e única amada, a quem ele é renovadamente fiel.
Da obediência a Deus e à Igreja, o papa falou matizando que "a disponibilidade do sacerdote faz da Igreja uma casa de portas abertas, refúgio de pecadores, lar para quem vive na rua, casa de bondade para os enfermos, acampamento para os jovens, sala de aula para a catequese dos pequenos da primeira comunhão...".
Ao terminar a homilia, mais longa que o habitual, Francisco pediu para que o Senhor Jesus "faça muitos jovens descobrirem o ardor do coração"; "que Ele cuide do brilho alegre nos olhos dos recém-ordenados, que querem abraçar o mundo todo"; "que Ele confirme a alegria sacerdotal dos que já têm vários anos de ministério" e "que resplandeça a alegria dos sacerdotes idosos, estejam sãos ou doentes".
Ao encerrar a eucaristia, o Santo Padre foi rezar diante da imagem de Maria.
Com esta solene eucaristia na Basílica de São Pedro, acompanhada pelas vozes do coro da Capela Sistina e com a multidão de fiéis que foram participar, começou no Vaticano o Tríduo Pascal.

Onde está o meu coração? Com qual destas pessoas me pareço?

Homilia do Papa na Celebração do Domingo de Ramos e da Paixão do Senhor

CIDADE DO VATICANO, 14 de Abril de 2014 (Zenit.org) - 
CELEBRAÇÃO DO DOMINGO DE RAMOS  E DA PAIXÃO DO SENHOR
HOMILIA DO PAPA FRANCISCO

Praça de São Pedro

Domingo, 13 de Abril de 2014
Esta semana começa com a festiva procissão dos ramos de oliveira: todo o povo acolhe Jesus. As crianças, os adolescentes cantam, louvam Jesus.
Mas esta semana continua com o mistério da morte de Jesus e da sua ressurreição. Ouvimos a Paixão do Senhor. Será bom pormo-nos apenas uma pergunta: Quem sou eu? Quem sou eu, face ao meu Senhor? Quem sou eu à vista de Jesus que entra festivamente em Jerusalém? Sou capaz de exprimir a minha alegria, de O louvar? Ou fico à distância? Quem sou eu, face a Jesus que sofre?
Escutámos muitos nomes, muitos nomes. O grupo dos líderes, alguns sacerdotes, alguns fariseus, alguns doutores da lei, que decidiram matá-Lo. Esperavam só a oportunidade boa para O prenderem. Sou eu como um deles?
Ouvimos também outro nome: Judas. Trinta moedas. Sou eu como Judas? Escutámos outros nomes: os discípulos que não entendiam nada, que adormeciam enquanto o Senhor sofria. A minha vida está adormecida? Ou sou como os discípulos, que não compreendiam o que era trair Jesus? Ou então como aquele discípulo que queria resolver tudo com a espada: sou eu como eles? Sou como Judas, que finge de amar e beija o Mestre para O entregar, para O trair? Sou eu um traidor? Sou eu como aqueles líderes que montam à pressa o tribunal e procuram testemunhas falsas: sou eu como eles? E, quando faço estas coisas – se é que as faço –, creio que, com isso, salvo o povo?
Sou eu como Pilatos? Quando vejo que a situação é difícil, lavo as mãos e não assumo a minha responsabilidade, condenando ou deixando condenar as pessoas?
Sou eu como aquela multidão que não sabia bem se estava numa reunião religiosa, num julgamento ou num circo, e escolhe Barrabás? Para ela tanto valia: era mais divertido, para humilhar Jesus.
Sou eu como os soldados, que batem no Senhor, cospem-Lhe em cima, insultam-No, divertem-se com a humilhação do Senhor?
Sou eu como Simão de Cirene que voltava do trabalho, cansado, mas teve a boa vontade de ajudar o Senhor a levar a cruz?
Sou eu como aqueles que passavam diante da Cruz e escarneciam de Jesus: «Era tão corajoso! Desça da cruz e nós acreditaremos n’Ele!». Escarnecem de Jesus...
Sou eu como aquelas mulheres corajosas, e como a Mãe de Jesus, que estavam lá e sofriam em silêncio?
Sou eu como José, o discípulo oculto, que leva o corpo de Jesus, com amor, para Lhe dar sepultura?
Sou eu como as duas Marias que permanecem junto do sepulcro chorando, rezando?

Sou eu como aqueles líderes que, no dia seguinte, foram ter com Pilatos para lhe dizer: «Olha que Ele afirmava que havia de ressuscitar. Não queremos mais enganos!» e bloqueiam a vida, bloqueiam o sepulcro para defender a doutrina, para que a vida não irrompa?

Onde está o meu coração? Com qual destas pessoas me pareço? Que esta pergunta nos acompanhe durante toda a semana.

© Copyright - Libreria Editrice Vaticana

MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA
NA CAPELA DA DOMUS SANCTAE MARTHAE

Homilia do papa na Casa Santa Marta: coração e mente fechados não deixam espaço para Deus

Francisco reflete sobre o perigo do pensamento único, que é escravo de esquemas prontos

Cidade do Vaticano,  (Zenit.orgRedacao | 191 visitas

Continua existindo hoje a ditadura do pensamento único, que mata a liberdade dos povos, a liberdade das pessoas, a liberdade das consciências: diante disso, temos que “vigiar e orar”, disse hoje o papa Francisco em sua homilia, na Casa Santa Marta.
Deus promete a Abraão que ele será pai de uma multidão de nações, mas ele e sua descendência deverão observar a aliança com o Senhor. A homilia do papa usou como referência a primeira leitura do dia para explicar a postura farisaica de fechamento diante da mensagem de Jesus. Os fariseus pensavam que tudo se resumia à observância dos mandamentos, mas estes “não são uma lei fria”, porque nascem de uma relação de amor; são “indicativos” que nos ajudam a não errar no caminho para encontrar Jesus.
Os fariseus fecham coração e mente “para qualquer novidade”, não entendem “o caminho da esperança”. Este é “o drama do coração fechado, o drama da mente fechada. E quando o coração está fechado, ele fecha a mente; e quando coração e mente estão fechados, não há lugar para Deus”, mas apenas para o que achamos que deve ser feito. Os mandamentos, porém, “carregam uma promessa; e os profetas despertam essa promessa”. Quem tem coração e mente fechados não consegue acolher a “mensagem de novidade” trazida por Jesus, que “é o que tinha sido prometido pela fidelidade de Deus e dos profetas. Mas eles não entendem”.
Explica o Santo Padre: “É um pensamento que não está aberto ao diálogo, à possibilidade da existência de outra coisa, à possibilidade de que Deus nos fale, nos diga como é o seu caminho, como Ele fez com os profetas. Aquela gente não tinha escutado os profetas e não escutava Jesus. É mais do que simples teimosia. É mais: é a idolatria do próprio pensamento. ‘Eu penso assim, isso tem que ser assim e fim’. Aquela gente tinha um pensamento único e queria impor esse pensamento ao povo de Deus. Por isso Jesus os repreende”.
O que Jesus repreende, observou Francisco, é a incoerência deles. “A teologia daquela gente se torna escrava de um esquema, de um esquema de pensamento, o pensamento único”.
O papa afirmou ainda que “não há possibilidade de diálogo, não há possibilidade de se abrir às novidades que Deus nos traz através dos profetas. Eles assassinaram os profetas. Aquela gente fecha a porta para a promessa de Deus. E, na história da humanidade, quando ocorre esse fenômeno do pensamento único, quantas desgraças! No século passado, todos nós vimos as ditaduras do pensamento único, que acabaram matando tanta gente! Quando eles se sentiam donos, ninguém podia pensar de outra forma. ‘O único jeito de pensar é assim’”.
Hoje também existe a idolatria do pensamento único, alertou o papa. “Hoje temos que pensar assim e quem não pensa assim não é moderno, não é aberto, ou coisa pior. Muitas vezes, alguns governantes dizem: ‘Peço ajuda financeira para isto’. E respondem: ‘Se você quer esta ajuda, tem que pensar assim e criar essa lei, e essa outra, e aquela outra…’. Hoje também sofremos a ditadura do pensamento único e essa ditadura é a mesma daquela gente [citada no Evangelho]: pegar as pedras para apedrejar a liberdade dos povos, a liberdade das pessoas, a liberdade das consciências, a relação das pessoas com Deus. E Jesus é crucificado mais uma vez”.
Ao terminar, o pontífice destacou que a exortação de nosso Senhor “diante desta ditadura é sempre a mesma: vigiar e orar; não ser tolos, não comprar coisas que não servem para sermos humildes e para rezarmos. Que nosso Senhor sempre nos dê a liberdade do coração aberto, para recebermos a sua Palavra, que é promessa, alegria e aliança”.

Homilia do papa na Casa Santa Marta: O profeta luta contra quem engaiola o Espírito Santo

Francisco nos lembra que anunciar o Evangelho acarreta perseguições e incompreensões

Quando anunciamos o Evangelho, enfrentamos a perseguição, recordou o papa Francisco na homilia da missa desta manhã, celebrada na capela da Casa Santa Marta. O pontífice reiterou que há hoje mais mártires do que nos primeiros tempos da Igreja e instou os fiéis a não terem medo das incompreensões nem das perseguições.
O Santo Padre desenvolveu a homilia com base na primeira leitura da missa, uma passagem do livro da Sabedoria. Ele destacou que os inimigos de Jesus preparam armadilhas, trabalham "com calúnias, matam a boa fama". É como se eles preparassem "o caldo para destruir o Justo", que se opõe às suas ações. Ao longo da história da salvação, observou Francisco, "os profetas sempre foram perseguidos" e o próprio Jesus o declara aos fariseus. Sempre, "na história da salvação, no tempo de Israel, inclusive na Igreja, os profetas foram perseguidos". Perseguidos porque dizem: "Vocês erraram de caminho! Voltem para os caminhos de Deus!". E isto "desagrada às pessoas que têm o poder do mau caminho".
"O Evangelho de hoje é claro, não é? Jesus se escondia, nos últimos dias, porque ainda não tinha chegado a sua hora. Mas Ele sabia qual ia ser o seu fim, como ia ser o seu fim. E Jesus é perseguido desde o princípio: recordamos que, no início da sua pregação, ele volta para a sua cidade, vai à sinagoga e prega; imediatamente, depois de uma grande admiração, eles começam: 'Mas este nós sabemos de onde veio. Ele é um dos nossos. Com que autoridade ele vem nos ensinar? Onde é que ele estudou?'. Tentam desqualificá-lo! É sempre o mesmo discurso, não é? 'Mas este nós sabemos de onde é!’ Só que Cristo, quando vier, ninguém saberá de onde é! Eles tentam desqualificar o Senhor, desqualificar o profeta para minar a sua autoridade!".
Tentam desqualificá-lo "porque Jesus saía e fazia os outros saírem daquele ambiente religioso fechado, daquela gaiola". O profeta "luta contra as pessoas que engaiolam o Espírito Santo. E é por isso que ele é perseguido: sempre!". Os profetas "são todos perseguidos ou incompreendidos, deixados de lado. Não se reconhece o lugar deles! Esta situação não terminou com a morte e ressurreição de Jesus: ela continua na Igreja! Perseguidos fora e perseguidos dentro!". Quando lemos as vidas dos santos, afirmou o papa, vemos "quantas incompreensões, quantas perseguições os santos sofreram", "porque eram profetas!".
"Muitos pensadores na Igreja também foram perseguidos. Penso em um deles, agora, neste momento, não muito distante de nós. Um homem de boa vontade, um verdadeiro profeta, que, com seus livros, repreendia a Igreja porque ela se afastava do caminho do Senhor. Eles rapidamente o chamaram. Seus livros acabaram no Index. Tiraram as suas cátedras. E este homem termina assim a vida. Não faz muito tempo. O tempo passou e hoje ele é beato! Como é possível que ontem ele fosse um herege e hoje seja um beato? É que, ontem, quem tinha o poder queria silenciá-lo, porque não gostava do que ele dizia. Hoje, a Igreja, que graças a Deus sabe se arrepender, diz: 'Não, este homem é bom!'. Mais ainda, ele está no caminho da santidade: é um beato!"
"Todas as pessoas que o Espírito Santo escolhe para dizer a verdade ao povo de Deus sofrem perseguições". E Jesus "é precisamente o modelo, o ícone". Nosso Senhor tomou sobre Ele "todas as perseguições do seu povo". E ainda hoje "os cristãos são perseguidos", denunciou o papa. "Eu me atrevo a dizer que há o mesmo número ou mais mártires agora do que nos primeiros tempos, porque, diante desta sociedade mundana, diante desta sociedade um tanto acomodada, que não quer problemas, eles dizem a verdade, eles anunciam Jesus Cristo".
"E, hoje, existe a pena de morte e a prisão para quem tem o Evangelho em casa, para quem ensina o catecismo em muitos países! Um católico de um desses países me dizia que eles não podem rezar juntos! É proibido! Só podem rezar sozinhos e escondidos. E quem quer celebrar a Eucaristia? Eles fazem uma festa de aniversário, simulam uma festa de aniversário, e lá celebram a Eucaristia, antes da festa. E, isto já aconteceu, quando eles veem que a polícia está chegando, escondem tudo às pressas e ‘Parabéns, parabéns. Muitas felicidades’, e continuam a festa. Depois, quando a polícia vai embora, eles terminam a missa. É assim que eles precisam fazer, porque é proibido rezar juntos. Hoje!".
E esta história de perseguições, destacou Francisco, "é o caminho do Senhor, é o caminho dos que seguem o Senhor”. Mas, "no final, tudo sempre termina como terminou com nosso Senhor: com a ressurreição, mas passando pela cruz!".
Francisco recordou o padre Mateus Ricci, evangelizador na China, que "não foi entendido. Mas ele obedeceu, como Jesus!". Sempre, voltou a insistir o papa, "existirão as perseguições, as incompreensões! Mas Jesus é o Senhor e este é o desafio e a cruz da nossa fé!" Que nosso Senhor "nos dê a graça de seguir o seu caminho e, se acontecer, também de carregar a cruz das perseguições".

A salvação é um presente



Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 13 de 27 de Março de 2014
A salvação «não se compra nem se vende» porque «é um presente totalmente gratuito». Mas para a receber Deus pede que tenhamos «um coração humilde, dócil, obediente». Foi quanto disse o Papa Francisco, na missa celebrada na manhã de terça-feira, 25 de Março, na capela da Casa de Santa Marta, convidando «a fazer festa e a dar graças a Deus» porque «hoje comemoramos uma etapa definitiva no caminho» rumo à salvação «que o homem percorreu desde o dia em que saiu do paraíso».
Precisamente «por esta razão hoje rejubilamos: a festa deste caminho de uma mãe para outra, de um pai para outro», explicou o Pontífice. E convidou a contemplar «o ícone de Eva e Adão, o ícone de Maria e Jesus», e a olhar para o decorrer da história com Deus que caminha sempre com o seu povo. Assim, prosseguiu, «hoje podemos abraçar o Pai que, graças ao sangue do seu Filho, se fez como um de nós, e nos salva: este Pai que nos espera todos os dias». Daqui o convite a dizer «obrigado: obrigado, Senhor, porque hoje Tu nos dizes que nos ofereceste a salvação».
Em síntese, o Senhor quer «abrandar o nosso coração», para que possa receber «aquela promessa que Ele fez no paraíso: por um homem entrou o pecado, por outro Homem veio a salvação». E precisamente este «caminho tão longo» ajudou «todos nós a ter um coração mais humano, mais próximo de Deus; não muito soberbo nem muito pretensioso».
O que significa então «o caminho da humildade, da humilhação»? Significa simplesmente, conclui o Papa Francisco, «dizer: eu sou homem, eu sou mulher e Tu és Deus! E ir em frente, na presença de Deus, como homem, como mulher na obediência e na docilidade do coração».
É no caminho da marginalização que Deus nos encontra e nos salva. Recordou o Papa Francisco na missa celebrada na manhã de segunda-feira, 24 de Março, na capela da Casa de Santa Marta, focalizando a sua homilia sobre uma chamada forte à humildade.
Para explicar o que significa estar «nas margens» a fim de ser salvo, o Pontífice referiu-se à liturgia do dia, que apresenta dois trechos particularmente eloquentes, tirados do segundo Livro dos Reis (5, 1-15a) e do Evangelho de Lucas (4, 24-30). Na citação evangélica, observou o Santo Padre, Jesus afirma que não pode fazer milagres na sua Nazaré «devido à falta de fé»: precisamente ali, onde crescera, «não tinham fé». Jesus, acrescentou, diz exactamente: «Nenhum profeta é bem aceite na sua pátria». E recordou também a história de Naaman, o sírio, com o profeta Eliseu, narrada na primeira leitura, e a da viúva de Sidónia com o profeta Elias.
«Os leprosos e as viúvas naquele tempo eram marginalizados», frisou o Papa. Em particular, «as viúvas viviam graças à caridade pública, não viviam o dia-a-dia da sociedade», enquanto os leprosos deviam viver fora, distantes do povo.
Assim na sinagoga de Nazaré, narra o Evangelho, «Jesus diz que aqui não haverá milagre: aqui vós não aceitais o profeta, porque não tendes necessidade, sois demasiado seguros». Com efeito, as pessoas que Jesus tinha em frente «eram tão seguras na sua “fé”, tão seguras na sua observância dos mandamentos, a ponto de não precisar de outra salvação». Uma atitude que revela, explicou o Pontífice, «o drama da observância dos mandamentos sem fé: eu salvo-me sozinho, porque vou à sinagoga todos os sábados, procuro obedecer aos mandamentos»; e «que não me venha dizer que aquele leproso ou aquela viúva, aqueles marginalizados, são melhores do que eu!».
Mas a palavra de Jesus vai em sentido contrário. Ele diz: «Olha que se tu não te sentires às margens, não terás salvação! Esta é a humildade, o caminho da humildade: sentir-se muito marginalizado» a ponto de ter «necessidade da salvação do Senhor. E só Ele salva; não a nossa observância dos preceitos».
Contudo, este ensinamento de Jesus, lê-se ainda no trecho de Lucas, não agradou ao povo de Nazaré, a ponto que o queriam assassinar». É «a mesma ira» que sente também Naaman, o sírio, segundo quanto refere o Antigo Testamento. Para ser curado da lepra, explicou o bispo de Roma, Naaman «vai ter com o rei com muitos dons, com numerosas riquezas: sente-se seguro, é o chefe do exército». Mas o profeta Eliseu convida-o a marginalizar-se e a imergir-se «sete vezes» no rio Jordão. Um convite que, reconheceu o Papa, provavelmente lhe pareceu «um pouco ridículo». Naaman «sentiu-se humilhado, desprezado e foi-se embora», precisamente como «os da sinagoga de Nazaré».
Portanto, foi-lhe pedido «um gesto de humildade, que obedecesse como uma criança». Mas ele reagiu, precisamente, com desdém. Porém foram os seus colaboradores, com o bom senso, que «o ajudaram a marginalizar-se, a cumprir um acto de humildade». E do rio ele saiu curado da lepra.
Exactamente esta, sublinhou o Papa, é «a mensagem de hoje, nesta terceira semana de Quaresma: se quisermos ser salvos, devemos escolher a estrada da humildade, da humilhação». Pode servir como testemunho Maria, que «no seu cântico não diz que está contente porque Deus viu a sua virgindade, a sua bondade e a sua doçura, tantas virtudes que ela tinha», mas exulta «porque o Senhor viu a humildade da sua serva, a sua pequenez». É precisamente «a humildade que o Senhor vê».
Assim também nós, afirmou o Pontífice, «devemos aprender esta sabedoria de marginalizar-nos, para que o Senhor nos encontre». Com efeito, Deus «não nos encontrará no centro das nossas certezas. Não, o Senhor não vai ali. Ele encontrar-nos-á na marginalização, nos nossos pecados, nos nossos erros, nas nossas necessidades de sermos curados espiritualmente, de sermos salvos. Ali o Senhor nos encontrará».
E este — reiterou mais uma vez — «é o caminho da humildade». A humildade cristã não é uma virtude» que nos faz dizer «eu não sirvo para nada» e nos faz «esconder a soberba»; pelo contrário, «a humildade cristã é dizer a verdade: sou pecador, sou pecadora!». Em síntese, trata-se simplesmente de «dizer a verdade; e esta é a nossa verdade». Mas, concluiu o Papa, «há também outra verdade: Deus salva-nos! Mas sobretudo quando estamos marginalizados; não nos salva na nossa segurança».
Humildade e oração, na Igreja, são o antídoto contra as alterações da palavra de Deus e a tentação de se apoderar dela, interpretando-a a seu bel-prazer e engaiolando o Espírito Santo. É a síntese da meditação proposta pelo Pontífice na missa celebrada sexta-feira de manhã, 21 de Março.
Precisamente «durante estes dias de quaresma o Senhor torna-se próximo de nós e a Igreja conduz-nos rumo ao tríduo pascal. Rumo à morte e ressurreição de Jesus», disse o Papa referindo-se às duas leituras da liturgia, a primeira tirada do Génesis (37, 3-4.12-13.17-28), e a segunda do Evangelho de Mateus (21,33-43.45). Estamos diante, explicou, do «drama não do povo — porque o povo compreendia que Jesus era um grande profeta — mas de alguns chefes do povo, de alguns sacerdotes daquele tempo, dos doutores da lei, dos idosos que não estavam com o coração aberto à palavra de Deus». Com efeito, «sentiam Jesus mas em vez de ver nele a promessa de Deus, em vez de o reconhecer como um grande profeta, tinham medo».

Evoca a essencialidade da fé a meditação quaresmal proposta pelo Papa Francisco na missa celebrada na manhã de20 de Março. Há uma palavra «mais do que mágica», capaz de abrir «a porta da esperança que nem sequer vemos» e restituir o nome a quem o perdeu por ter confiado apenas em si mesmo e nas forças humanas. Esta palavra é «Pai» e deve ser pronunciada com a certeza de ouvir a voz de Deus que nos responde chamando-nos «filhos». O Pontífice pediu «ao Senhor a graça da humildade, de olhar para Jesus como o Salvador que nos fala: fala a mim! Cada um de nós deve dizer: fala a mim!». E «quando lemos o Evangelho: fala a mim!». Eis então o motivo do convite a «abrir o coração ao Espírito Santo que dá força a esta palavra» e a «rezar, rezar tanto para que tenhamos a docilidade de receber esta palavra e obedecer-lhe». 

Deus nos espera e abre uma porta que nós não vemos




CIDADE DO VATICANO, 20 de Março de 2014 (Zenit.org) -
 O homem que confia em si mesmo, nas próprias riquezas e nas ideologias está destinado à infelicidade. Mas quem confia em Jesus Cristo dá frutos, mesmo no tempo da carestia. Esta é a ideia que o Santo Padre desenvolveu na manhã de hoje, em sua homilia durante a missa celebrada na Casa Santa Marta.
"Maldito o homem que confia no homem" e "o homem que confia em si mesmo": ele será como "um arbusto no deserto", condenado pela seca a permanecer sem frutos e morrer. A partir da primeira leitura, o papa Francisco recordou, porém, que é "bendito o homem que confia no Senhor", porque "ele é como uma árvore plantada junto a um riacho", que, em tempo de seca, "não deixa de produzir frutos". O papa afirmou que "somente no Senhor está segura a nossa confiança. Outras confianças de nada nos servem, não nos salvam, não nos dão vida, não nos dão alegria".
Ele reconheceu, no entanto, que nós "gostamos de confiar em nós mesmos, de confiar em tal amigo ou em tal situação boa que eu tenho ou em tal ideologia". Nesses casos, "nosso Senhor é deixado um pouco de lado". O pontífice recordou que o homem, ao agir assim, se fecha em si mesmo, "sem horizontes, sem portas abertas, sem janelas", e, deste modo, "ele não terá salvação, não pode salvar a si mesmo". O papa explicou que é isto o que acontece com o rico do Evangelho: "ele tinha tudo, usava roupas de púrpura, comia grandes banquetes todos os dias". Estava muito contente, mas não se dava conta de que, na porta da sua própria casa, coberto de chagas, havia um pobre. O papa destaca que o Evangelho diz o nome do pobre: ele se chamava Lázaro. Já o rico não tem nome.
Francisco afirmou que “esta é a maior maldição de quem confia em si mesmo ou nas forças e possibilidades dos homens, mas não em Deus: perder o próprio nome. Como você se chama? Conta bancária número tal, na agência tal. Como você se chama? Tantas propriedades, tantos palácios, tantas... Como você se chama? As coisas que nós temos, os ídolos”, não são o nosso nome.
O pontífice destacou que todos nós temos a fraqueza de basear as nossas esperanças em nós mesmos, ou em amigos, ou em possibilidades meramente humanas, esquecendo-nos de nosso Senhor. E isto nos leva ao caminho da infelicidade.
Francisco explicou: "Hoje, neste dia de quaresma, nos fará bem perguntar a nós mesmos: onde está a minha confiança? No Senhor? Ou eu sou um pagão que confia nas coisas, nos ídolos que eu fiz? Eu ainda tenho um nome ou comecei a perder o meu nome? Ou me chamo só de 'eu'? Eu, me, mim, comigo, para mim, somente eu? Para mim, para mim... sempre esse egoísmo: 'eu'. Isto não nos traz a salvação".
Mas há uma porta de esperança no final, declarou o Santo Padre, mesmo para aqueles que confiaram em si mesmos e "perderam o seu nome". Disse Francisco: “No final, no final, no final sempre há uma possibilidade. E aquele homem, quando se dá conta de que tinha perdido o próprio nome, de que tinha perdido tudo, tudo, levanta os olhos e só diz uma palavra: 'Pai!'”.


“E a resposta de Deus é uma só palavra: 'Filho!'. Se algum de nós, nesta vida, de tanto ter confiança no homem e em si mesmo, acaba perdendo o seu nome, por perder essa dignidade, ainda resta a possibilidade de dizer esta palavra que é mais do que mágica, é mais, é forte: 'Pai!'. Ele sempre nos espera para abrir a porta que nós não vemos e nos dirá: 'Filho!'. Peçamos a nosso Senhor a graça da sabedoria para todos nós, para termos confiança somente nele, não nas coisas, nas forças humanas, somente nele".


Cristãos disfarçados


Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 12 de 20 de Março de 2014

O cristão que pensa que se pode salvar sozinho «é um hipócrita», um «cristão disfarçado». A quaresma é o tempo oportuno para mudar a vida e para se aproximar de Jesus, pedindo perdão, arrependidos e prontos a testemunhar a sua luz e cuidando dos necessitados. Uma nova reflexão quaresmal foi proposta na manhã de terça-feira 18 de Março, pelo Papa Francisco na missa celebrada em Santa Marta.
«O tempo da quaresma — disse na homilia — é oportuno para nos aproximar mais do Senhor». De resto, explicou, a própria palavra o diz, porque quaresma significa conversão. E precisamente com um convite à conversão, disse comentando o trecho de Isaías (1, 10.16-20), «começa a primeira leitura de hoje. Com efeito, o Senhor chama à conversão; e curiosamente chama duas cidades pecadoras», Sodoma e Gomorra, às quais dirige o convite: «Convertei-vos, mudai de vida, aproximai-vos do Senhor». E explicou: «este é o convite da quaresma: são quarenta dias para se aproximar do Senhor, para estar mais perto dele. Porque todos nós temos necessidade de mudar de vida».
Depois o Papa referiu-se ao trecho do evangelho de Marcos (23, 1-12) acabado de proclamar: «Lemos no evangelho que o Senhor quer uma aproximação verdadeira, sincera. Mas o que fazem os hipócritas? Fingem. Fingem-se bons. Fazem uma pose de imagenzinhas, rezam olhando para o céu, chamando a atenção sobre si, sentem-se mais justos do que os outros, desprezam os outros». E proclamam-se bons católicos porque conhecem benfeitores, bispos e cardeais.
Esta é — frisou — a hipocrisia. E o Senhor diz não, porque ninguém se deve sentir justo por decisão pessoal. «Todos precisamos de ser justificados — repetiu o bispo de Roma — e o único que nos justifica é Jesus Cristo. Por isso devemos aproximar-nos: para não sermos cristãos disfarçados».
Mas «qual é o sinal de que estamos na estrada certa? A Escritura diz-nos: defender o oprimido, cuidar do próximo, do doente, do pobre, dos necessitados, dos ignorantes. Esta é a pedra de comparação». «Os hipócritas não podem fazer isto, porque são tão cheios de si que se tornaram cegos e não olham para os outros». Mas «se caminharmos um pouco e nos aproximarmos do Senhor, a luz do Pai faz ver tudo isto e ajudamos os irmãos. Este é o sinal da conversão».
Portanto, a quaresma serve para «mudar a nossa vida, para ajustar a vida e nos aproximar do Senhor». E a hipocrisia é «o sinal de que nos afastamos do Senhor». E concluiu: «O Senhor nos dê luz e coragem: luz para conhecer o que acontece dentro de nós e coragem para nos convertermos, nos aproximarmos do Senhor. É bom estar próximo do Senhor».
Quem sou eu para julgar os outros? É a pergunta que devemos fazer a nós mesmos para dar espaço à misericórdia, a atitude justa para construir a paz entre as pessoas, as nações e dentro de nós. Para sermos mulheres e homens misericordiosos é necessário reconhecer, em primeiro lugar, que somos pecadores e depois alargar o coração até esquecer as ofensas recebidas.
Foi precisamente a misericórdia que o Papa focalizou na homilia da missa celebrada na manhã de segunda-feira, 17 de Março. Referindo-se aos trechos do livro do profeta Daniel (9, 4-10) e do Evangelho de Lucas (6, 36-38), o Santo Padre explicou que «o convite de Jesus à misericórdia é para nos aproximarmos, para imitar melhor o nosso Deus Pai: sede misericordiosos, como o vosso Pai é misericordioso». Mas, reconheceu imediatamente o Pontífice, «não é fácil compreender esta atitude da misericórdia, porque nós estamos habituados a descarregar nos outros: tu fizeste isto, agora tens que fazer isto». Em poucas palavras, «nós julgamos, temos este hábito, e não somos pessoas» que deixam «um pouco de espaço à compreensão e também à misericórdia».
«Para ser misericordiosos são necessárias duas atitudes» afirmou o Papa. A primeira é «o conhecimento de si mesmos». Na primeira leitura Daniel narra o momento da oração do povo que se confessa pecador diante de Deus. Assim, explicou o Pontífice ao comentar o trecho, «a justiça de Deus diante do povo arrependido transforma-se em misericórdia e perdão». E interpela também a nós, convidando-nos a «dar um pouco de espaço a esta atitude». «Reconhecer que se fez algo contra o Senhor e envergonhar-se diante de Deus é uma graça: a graça de ser pecadores!».
«O nosso pai Adão — afirmou o Papa — deu-nos um exemplo daquilo que não se deve fazer». De facto, ele atribui a culpa à mulher por ter comido o fruto e justifica-se dizendo: «Eu não pequei». Mas o mesmo faz depois Eva, que dá a culpa à serpente. Ao contrário, reiterou o Santo Padre, é importante reconhecer os nossos pecados e ter necessidade do perdão de Deus. Não se devem procurar desculpas e «culpabilizar os outros». E «se fizermos isto, quantos coisas boas acontecerão: seremos homens!».
A segunda atitude para ser misericordiosos «é alargar o coração». Precisamente «a vergonha, o arrependimento, alarga o coração pequenino, egoísta, porque dá espaço a Deus misericordioso para nos perdoar». Mas que significa alargar o coração? Em primeiro lugar, reconhecer que somos pecadores, sem olhar para o que os outros fizeram. E a pergunta fundamental torna-se esta: «Quem sou eu para julgar isto? Quem sou eu para falar disto? Quem sou eu, que fiz as mesmas coisas ou até pior?». Com efeito, «se tiveres o coração largo, grande, podes receber mais!». E um «coração grande não se intromete na vida dos outros, não condena, mas perdoa e esquece», exactamente como «Deus esqueceu e perdoou os meus pecados».
Por conseguinte, para sermos misericordiosos é necessário invocar ao Senhor — «pois é uma graça» — e «ter estas duas atitudes: reconhecer os próprios pecados e envergonharmo-nos» e esquecer os pecados e as ofensas dos outros.
Este é, sugeriu o Papa, «o caminho da misericórdia que devemos pedir». Se «todos nós, os povos, as pessoas, as famílias, os bairros, tivéssemos esta atitude — exclamou — quanta paz haveria no mundo, quanta paz nos nossos corações, porque a misericórdia nos traz a paz!». E concluiu: «Recordai-vos sempre: quem sou eu para julgar? Envergonhar-se e alargar o coração! Que o Senhor nos conceda esta graça!».

MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA
NA CAPELA DA DOMUS SANCTAE MARTHAE

O fantasma da hipocrisia

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 11 de 13 de Março de 2014
O «fantasma da hipocrisia» faz-nos esquecer como se acaricia um doente, uma criança ou um idoso. E não nos faz fitar os olhos da pessoa a quem damos de modo apressado a esmola retraindo imediatamente a mão para não a sujar. Durante a missa celebrada na manhã de 7 de Março na capela da Casa de Santa Marta o Papa dirigiu uma exortação a «nunca se envergonhar» da «carne do irmão».
Na sexta-feira depois das cinzas a Igreja, explicou o Pontífice, propõe uma meditação sobre o significado verdadeiro do jejum, através de duas leituras incisivas, tiradas do livro do profeta Isaías (58, 1-9A) e do Evangelho de Mateus (9, 14-15). «Por detrás das leituras de hoje — afirmou o Pontífice — está o fantasma da hipocrisia, da formalidade de cumprir os mandamentos, neste caso o jejum». Portanto, «Jesus volta ao tema da hipocrisia muitas vezes quando vê que os doutores da lei pensam que são perfeitos: cumprem tudo o que está nos mandamentos como se fosse uma formalidade».
E aqui, advertiu o Papa, há «um problema de memória» relativo a «este duplo aspecto do caminhar pela estrada da vida». De facto, os hipócritas «esqueceram que foram eleitos por Deus num povo, não individualmente. Esqueceram a história do seu povo, a história de salvação, eleição, aliança e promessa», que provém directamente do Senhor.
E assim fazendo, continuou, «reduziram esta história a uma ética. Para eles, a vida religiosa era uma ética». Para eles a este modo «explica-se que na época de Jesus, dizem os teólogos, havia mais ou menos trezentos mandamentos» para observar. Mas «receber do Senhor o amor de um pai, receber do Senhor a identidade de um povo e depois transformá-la numa ética» significa «rejeitar o dom de amor». De resto, frisou, os hipócritas «são pessoas boas, fazem tudo o que se deve fazer, parecem boas». Mas «são eticistas, sem bondade, porque perderam o sentido de pertença a um povo».
O sentido do verdadeiro «jejum é aquele que — afirmou o bispo de Roma — se preocupa pela vida do próximo, que não sente vergonha da carne do irmão, como diz Isaías. De facto, «a nossa perfeição, a nossa santidade vai em frente com o nosso povo, no qual fomos eleitos e inseridos». E «o nosso maior acto de santidade consiste precisamente na carne do irmão e na carne de Jesus Cristo».
«A salvação de Deus — afirmou o Pontífice — está num povo. Um povo que vai em frente, irmãos que não se envergonham uns dos outros». Mas exactamente por isso, advertiu, «é o jejum mais difícil: o jejum da bondade. A bondade leva-nos a isto». E «talvez — explicou citando o Evangelho — o sacerdote que passou perto daquele homem ferido tenha pensado», referindo-se aos mandamentos da época: «Mas se eu tocar aquele sangue, aquela carne ferida, ficarei impuro e não poderei celebrar ao sábado! E envergonhou-se da carne daquele homem. Isto é hipocrisia!». Ao contrário, observou o Santo Padre, «aquele pecador passou e viu-o: viu a carne do seu irmão, a carne de um homem do seu povo, filho de Deus como ele. E não se envergonhou». «A proposta da Igreja hoje» sugere portanto um verdadeiro exame de consciência através de uma série de perguntas que o Papa fez aos presentes: «Sinto vergonha da carne do meu irmão, da minha irmã? Quando ofereço a esmola, deixo cair a moeda sem tocar a mão? E, se por acaso a tocar, faço-o apressadamente?», questionou imitando o gesto de quem limpa a mão. «Quando ofereço a esmola, fito o meu irmão, a minha irmã, nos olhos? Quando sei que uma pessoa está doente vou visitá-la? Saúdo-a com ternura?».
Para completar este exame de consciência, frisou o Papa, «existe um sinal que talvez vos ajude». Trata-se de «uma pergunta: sei acariciar doentes, idosos e crianças? Ou perdi o sentido da carícia?». Os hipócritas, continuou, não sabem acariciar, esqueceram como se faz. Então, eis a recomendação para «não se envergonhar da carne do nosso irmão: é a nossa carne». E «seremos julgados», concluiu o Pontífice, precisamente pelo nosso comportamento em relação «a este irmão e esta irmã» e certamente não «pelo jejum hipócrita».
E na missa celebrada na quinta-feira 6 de Março, o Papa Francisco falou da redescoberta da fecundidade de uma vida segundo o estilo cristão. Comentando o trecho do Evangelho de Lucas (9, 22-25), proposto pela liturgia, o Pontífice apresentou-o como uma reflexão em sintonia com a narração do jovem rico, o qual queria seguir Jesus «mas depois afastou-se triste porque tinha tanto dinheiro, ao qual era muito apegado para renunciar».
No início da Quaresma a Igreja «faz-nos ler, faz-nos sentir esta mensagem», observou o Pontífice. Uma mensagem que «poderíamos intitular o estilo cristão: “Se alguém quiser vim após mim, isto é, ser cristão, ser meu discípulo, renegue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me”». É «o caminho da humildade, também da humilhação, da renegação de si mesmo», porque o «estilo cristão sem cruz não é cristão» e «se a cruz for uma cruz sem Jesus, não é cristã».
Este é o estilo de vida que «nos salvará, que nos dará alegria e nos tornará fecundos. Trata-se de um caminho que deve ser percorrido «com alegria, porque — explicou o Papa — nos dá a alegria. Seguir Jesus é alegria». Mas, repetiu, é preciso segui-lo com o seu estilo, e não com o estilo do mundo», fazendo o que se pode: o importante é fazê-lo «para dar vida aos outros e não para dar vida a si mesmo. É o espírito de generosidade».
Eis então o caminho a seguir: «humildade, serviço, nenhum egoísmo, não sentir-se importante nem mostrar-se diante dos outros como uma pessoa importante: sou cristão...!». A este propósito o Papa Francisco citou a Imitação de Cristo, que — frisou — «nos dá um conselho muito bom: ama, nesciri et pro nihilo reputari, “ama, não sejas conhecido e considera-te como nada”». É a humildade cristã. Foi o quer fez Jesus.
«Pensemos em Jesus que está diante de nós — prosseguiu — que nos guia por aquele caminho. Esta é a nossa alegria e a nossa fecundidade: andar com Jesus. Outras alegrias não são fecundas, pensam apenas, como diz o Senhor, em ganhar o mundo inteiro mas no final perdem-se e arruínam-se a si mesmos».
Por isso, «no início da Quaresma — foi o seu convite conclusivo — peçamos ao Senhor que nos ensine um pouco este estilo cristão de serviço, de alegria, de nos perdermos a nós mesmos e de fecundidade com Ele, como Ele a quer».


Homilia do papa Francisco: A vida de fé sem

 vida de caridade é hipócrita



Santo Padre pede que os católicos não tenham vergonha da carne do seu irmão
Por Redacao
CIDADE DO VATICANO, 07 de Março de 2014 (Zenit.org) - "Eu me envergonho da carne do meu irmão, da minha irmã?", perguntou o Santo Padre na homilia desta manhã, na Casa Santa Marta. O papa destacou que a vida de fé está estreitamente unida com a vida de caridade para com os pobres. Sem essa vida de caridade em união com a vida de fé, o que se professa é pura hipocrisia.
Francisco explicou que o cristianismo não é uma regra sem alma, não é um manual de observações formais para pessoas que mostram a face aparentemente bela da hipocrisia para esconder um coração vazio de caridade. Ele também recordou que o cristianismo é a própria carne de Cristo, que se aproxima, sem vergonha, daqueles que sofrem. Para aprofundar neste ponto, o pontífice usou como referência o Evangelho de hoje, em que Jesus dialoga com os doutores da lei que criticam os discípulos porque eles não respeitam o jejum, em contraste com eles e com os fariseus, que jejuam e fazem questão de demonstrá-lo. O Santo Padre ressaltou que os doutores da lei tinham transformado a observação dos mandamentos em uma "formalidade", reduzindo a "vida religiosa" a "uma forma de ética" e esquecendo-se das raízes, ou seja, "uma história de salvação, de escolha e de aliança".
Assim, o papa Francisco afirmou: "Receber do Senhor o amor de um Pai, receber do Senhor a identidade de um povo e depois transformá-la em um mero sistema de ética é rejeitar esse dom de amor. Essas pessoas hipócritas são pessoas boas, fazem tudo o que tem que ser feito. Parecem boas! São 'especialistas em ética', mas 'especialistas em ética' sem bondade, porque perderam o senso de pertença a um povo! Nosso Senhor dá a salvação dentro de um povo, no pertencimento a um povo".
Francisco observou também que o profeta Isaías já tinha descrito com clareza qual era o jejum verdadeiro aos olhos de Deus: "dissolver os injustos grilhões", "tornar livres os oprimidos", mas também "compartilhar o pão com o faminto, acolher em casa os indigentes que não têm teto", "vestir quem está nu". E matizou: "Este é o jejum que nosso Senhor quer! O jejum que se preocupa com a vida do irmão, que não se envergonha, e isso é o próprio Isaías quem diz, que não se envergonha da carne do irmão. A nossa perfeição, a nossa santidade se realiza com o nosso povo, o povo em que nós somos escolhidos e introduzidos. O nosso maior ato de santidade está precisamente na carne do irmão e na carne de Jesus Cristo. O ato de santidade de hoje, nosso, aqui, no altar, não é um jejum hipócrita: é um não envergonhar-se da carne de Cristo que vem hoje aqui! É o mistério do Corpo e do Sangue de Cristo. É compartilhar o pão com o faminto, cuidar dos doentes, dos idosos, de quem não pode nos dar nada em troca: isto é não se envergonhar da carne!".
Isto quer dizer que o "jejum mais difícil", afirmou o papa, é "o jejum da bondade". É o jejum de que é capaz o Bom Samaritano, que se inclina para ajudar o homem ferido, mas não o jejum do sacerdote, que olha para o mesmo desafortunado e passa direto, talvez por medo de se contaminar. E esta é, portanto, "a pergunta que a Igreja nos faz hoje: eu me envergonho da carne do meu irmão, da minha irmã?".

Francisco indagou ainda: "Quando eu dou esmola, deixo a moeda cair sem tocar na mão do meu irmão? E se toco na mão dele por acaso, me limpo logo em seguida? Quando eu dou uma esmola, olho nos olhos do meu irmão, da minha irmã? Quando eu sei que uma pessoa está doente, vou visitá-la? Saúdo aquele doente com ternura? Existe um sinal que talvez nos ajude. É uma pergunta: eu sei acariciar os doentes, os idosos, as crianças? Ou perdi o sentido da carícia? Esses hipócritas não sabiam acariciar! Eles tinham se esquecido... Não ter vergonha da carne do nosso irmão: ela é a nossa carne! É conforme fizermos isso com o nosso irmão, com a nossa irmã, que seremos julgados".


A Quaresma vem despertar-nos do risco de avançar por inércia


Homilia do Papa Francisco na Celebração Eucarística de imposição das cinzas
ROMA, 05 de Março de 2014 (Zenit.org) - O Papa Francisco presidiu, nesta quarta-feira (5) a procissão penitencial que partiu da Basílica de Santo Anselmo até a Basílica de Santa Sabina, em Roma, onde celebrou a missa com a bênção e imposição das cinzas. Apresentamos, a seguir, o texto da homilia pronunciada pelo Papa.
“Rasgai o coração, e não as vestes” (Jl 2,13).
Com estas palavras penetrantes do profeta Joel, a liturgia nos introduz hoje na Quaresma, indicando na conversão do coração a característica deste  tempo de graça. O apelo profético constitui um desafio para todos nós, sem exceção, e nos lembra que a conversão não se reduz à formas exteriores ou em propósitos vagos, mas envolve e transforma toda a existência a partir do centro da pessoa, da consciência. Somos convidados a iniciar esse caminho, no qual, desafiando a rotina, nos esforçamos para abrir nossos olhos e ouvidos, mas especialmente o coração, para ir além do nosso “quintal”.
Abrir-se a Deus e aos outros. Vivemos em um mundo cada vez mais artificial, em uma cultura do “fazer”, do “útil”, onde sem perceber excluímos a Deus de nosso horizonte. A Quaresma nos convida a despertar, para nos lembrar que somos criaturas, que não somos Deus
E também em relação aos outros , corremos o risco de nos fechar, de esquecê-los.  Mas só quando as dificuldades e os sofrimentos de nossos irmãos nos desafiam, só então podemos começar nosso caminho de conversão rumo à Páscoa. É um itinerário que inclui a cruz e a renúncia. O Evangelho de hoje mostra os elementos desta jornada espiritual: a oração, o jejum e a esmola (cf. Mt 6,1-6.16-18). Todos os três envolvem a necessidade de não ser dominado por coisas que aparecem: o que importa não é a aparência, e o valor da vida não depende da aprovação dos outros ou do sucesso, mas daquilo que temos dentro de nós.
O primeiro elemento é a oração. A oração é a força do cristão e de toda pessoa que crê. Na fraqueza e na fragilidade da nossa vida, podemos nos voltar para Deus com a confiança de filhos e entrar em comunhão com Ele. Diante de tantas feridas que nos fazem mal e poderiam endurecer o coração, somos chamados a mergulhar no mar da oração, que é o mar do amor sem limites de Deus, para desfrutar de sua ternura. A Quaresma é um tempo de oração, uma oração mais intensa, mais assídua, mais capaz de cuidar das necessidades dos irmãos, de interceder  junto a Deus por tantas situações de pobreza e sofrimento.
O segundo elemento qualificante do caminho quaresmal é o jejum. Devemos ter cuidado para não fazer um jejum formal, ou que na verdade nos “sacia” porque nos faz sentir justificados. O jejum faz sentido se  realmente afeta a nossa segurança, e também se consegue um benefício para os outros, se nos ajuda a crescer no espírito do Bom Samaritano, que se inclina sobre o seu irmão em necessidade e cuida dele. O jejum envolve a escolha de uma vida sóbria, que não desperdiça, que não descarta. O jejum ajuda-nos a treinar o coração na essencialidade na partilha. É um sinal de consciência e responsabilidade diante  das injustiças, abusos, especialmente para com os pobres e os pequeninos, e é um sinal da confiança que depositamos em Deus e sua na providência.
O terceiro elemento é a esmola: ela indica a gratuidade, porque a esmola é dada a alguém de quem não se pode esperar  nada em troca. A gratuidade deveria ser uma das características do cristão, que, consciente de ter recebido tudo de Deus livremente, isto é, sem qualquer mérito, aprende dar aos outros gratuitamente. Hoje, muitas vezes a gratuidade não faz parte da vida cotidiana, pois tudo é comprado e vendido. Tudo é cálculo e medição. A esmola ajuda-nos a viver a gratuidade do dom, que é a liberdade da obsessão pela posse, o medo de perder o que se tem, da tristeza daqueles que não querem compartilhar com os outros o seu próprio bem-estar.
Com seus apelos à conversão, a Quaresma  providencialmente vem despertar-nos, para sacudir- nos  do torpor, do risco de avançar por inércia. A exortação que o Senhor nos faz através do profeta Joel é alta e clara: “Retornem para mim de todo o vosso coração” (Joel 2, 12). Por que devemos voltar para Deus? Porque algo está errado em nós, na sociedade, na Igreja e nós precisamos de mudança, de uma transformação, precisamos nos converter! Mais uma vez a Quaresma vem  dirigir-nos um apelo profético para nos lembrar que é possível realizar algo novo em  nós mesmos e ao nosso redor, simplesmente porque Deus é fiel, continua a ser cheio de bondade e misericórdia, e está sempre pronto a perdoar e recomeçar. Com esta confiança filial, coloquemo-nos a caminho!

(Trad.:Canção Nova)

Nenhum comentário:

Postar um comentário